“All in all, it's just another brick in the wall
All in all, you're just another brick in the wall”[1]
A palavra "aluno" tem uma etimologia rica e interessante que, infelizmente, foi distorcida ao longo do tempo. Ela se origina do latim "alumnus" (masculino) e "alumna" (feminino), a palavra carregava originalmente a ideia de "criança de peito" ou "criança que mama", referindo-se ao período inicial da vida em que uma criança recebia os cuidados de uma ama de leite.
Entretanto, a interpretação equivocada de que "aluno" significa "sem luz" tem perpetuado uma visão ultrapassada do papel do estudante na relação com o professor. Essa interpretação, sem fundamento etimológico, sugere que o aluno é uma "tábula rasa" que precisa ser totalmente moldada e iluminada pelo professor, como se este fosse o único detentor do saber. Conceito decadente há décadas.
Essa concepção antiquada do aluno como um ser passivo, vazio de conhecimento prévio e à espera de ser preenchido, é prejudicial em vários aspectos. Em primeiro lugar, ela desconsidera o fato de que os alunos têm experiências e saberes prévios que são fundamentais para o processo de aprendizagem. Cada aluno traz consigo uma bagagem única, fruto de suas vivências e culturas, que pode enriquecer o ambiente educacional.
Além disso, a visão do professor como o único detentor do conhecimento reforça a hierarquia autoritária na sala de aula, dificultando a construção de um ambiente colaborativo de aprendizado, como critica Foucault dizendo que esse tipo de visão apenas reforça as estruturas de poder dentro da sociedade. A troca de saberes e perspectivas entre alunos e professores é essencial para um ensino mais enriquecedor e significativo.
Outro problema da versão incorreta da etimologia é que ela diminui o papel ativo e protagonista do aluno em sua própria educação. Ao ser visto como um recipiente vazio a ser preenchido, o estudante pode se sentir desestimulado, desvalorizado e até desumanizado (podemos apelar para Foucault, Adorno, Piaget e Freire). Isso pode comprometer sua motivação para aprender e se desenvolver intelectualmente.
É importante resgatar a verdadeira origem da palavra "aluno" e compreender que ela remete ao cuidado e nutrição no período inicial da vida, mas sua interpretação atual está intrinsecamente ligada ao ato de aprender e buscar conhecimento. O aluno é um sujeito ativo, capaz de aprender, questionar, criar e se desenvolver em parceria com os professores e demais colegas.
Uma educação verdadeiramente transformadora deve encorajar a autonomia dos alunos, valorizar suas experiências e incentivar o pensamento crítico. Nesse contexto, o papel do professor é o de um facilitador do aprendizado, estimulando a curiosidade, guiando os alunos e criando um ambiente inclusivo e participativo.
Não concordo com a abolição da palavra como vi em alguns lugares, é fundamental desconstruir a visão ultrapassada do aluno como "ser sem luz" e debater a riqueza da verdadeira etimologia da palavra. Somente ao reconhecer o papel ativo do aluno em seu processo educacional é que podemos construir uma educação mais significativa, inclusiva e transformadora para todos.
[1] “No fim das contas, é apenas mais um tijolo no muro/ Ao todo, você é apenas mais um tijolo no muro” (tradução minha). Refrão da música Another Brick in the wall (part II) composta por Roger Waters e interpretada pela banda Pink Floyd. Gravada no álbum The Wall (1979) e transformado em filme (1982). Nesta música especialmente retrata uma educação que equaliza todos os alunos e depois os moe em uma máquina. Dizendo que tanto os alunos quanto professores são apenas peças que se encaixam numa estrutura desumanizante (o muro). O professor humilhado em casa desforra nos alunos suas frustrações.
Oi Marco. Se compararmos os paradigmas epistemológicos da educação pedagogia, andragogia e eutagogia (há vasto material na rede). A pedagogia está relacionada com educação de crianças, que não possuem autonomia para definir o que, como estudar e como avaliar/demonstrar as competências adquiridas. Gostei de seu texto pois fiz um link com a andragogia, meu foco de atuação docente. Lá o professor se chama mediador e o "aluno" de aprendente. Seu texto me encaixou aqui! Na pedagogia o professor fica no tablado e os alunos em carreiras, logo abaixo, para preencher seu vazio em conteúdo. O alunado só deve perguntar ao final da brilhante explanação, monólogo, discurso, do professor. Na andragogia a aprendizagem é de adultos, e há uma troca entre aprendentes e mediador. E os conteúdos dessa mediação, desse processo de ensino-aprendizagem, deve fazer sentido para os aprendentes. Por isso, no meu caso, como mediadora, será um processo com base em resolução de problema ou estudo de um caso que faça sentido para eles. No arcabouço das metodologias ativas. Será que abordar o termo aluno, à luz desses 3 paradigmas pode ser interessante?
ResponderExcluirObrigado pela complementação do texto.
ResponderExcluirAdorei o texto! Obrigada por compartilhar tanto conhecimento! Fui teletransportada para minhas aulas de Filosofia da Educação discutindo importantes educadores como Paulo Freire... Não por acaso ele foi citado, né? Rsrsrs
ResponderExcluirEu que agradeço.
ResponderExcluirQue reflexão maravilhosa!!!! Estou gostando muito dos textos aqui escritos! Parabéns, Março Machado!!!
ResponderExcluirEu que agradeço estar sempre visitando meu blog! Será sempre um prazer para mim.
ExcluirTexto brilhante, parabéns Marco Machado
ResponderExcluirMuito obrigado!
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