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Caminhar ou correr? Nem tudo é tão simples

Hoje vamos sair um pouco da esfera filosófica, mas sem nos afastarmos do campo das reflexões. Vamos pensar em como a mídia tradicional por vezes falha em difundir conceitos e conselhos sobre exercício físico, atividade física e saúde. 

Muito oportuna a coluna traduzida do NYT sobre caminhar ou correr (25/11/2023). Já são descritos na literatura científica os benefícios de praticar exercícios físicos com frequência. Contudo, gostaria de pontuar 2 itens que não foram contemplados na coluna.



O primeiro é sobre a prescrição e acompanhamento do exercício. Na coluna é apresentada uma progressão que poderíamos chamar de genérica, o principal questionamento é que existem características individuais que interferem nessa progressão. Fatores como idade, histórico de prática de exercícios, qualidade do sono e alimentação, doenças, uso de medicamentos, postura e equilíbrio entre outros, irão determinar o quanto se pode adicionar de exercícios a cada intervalo de tempo. É arriscado usar uma única receita para todos. Não é o médico que irá dizer isso, o interessante é que uma equipe multidisciplinar possa avaliar e acompanhar cada caso.

O segundo ponto é referente a que tipos de exercícios precisam ser feitos para que a saúde e longevidade sejam contempladas. O Colégio Americano de Medicina do Esportes (ACSM), a Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE), o Colégio Europeu de Ciências do Esporte (ECSS) e outras instituições orientam para que sejam atendidas três condições: a capacidade aeróbia (conforme citado na coluna), a força muscular e a flexibilidade (ambas omitidas). Tanto a caminhada quanto a corrida, mesmo sendo excelentes modalidades, não atendem de forma satisfatória a todos os três componentes. Exercícios específicos para força muscular (que não precisam ser realizados com grandes pesos e nem mesmo em academias) e de flexibilidade (ninguém precisa ser um contorcionista) devem estar incluídos no repertório de exercícios praticados. Sobremaneira, pessoas idosas precisam mais de exercícios de força do que de caminhadas ou corridas.
Concluindo, a avaliação e prescrição por profissionais qualificados aumentam as chances de sucesso e diminuem as chances de lesões. Um repertório mais variado de exercícios trará mais benefícios do que correr ou caminhar apenas.  


Um rápido adendo, políticas públicas de incentivo à prática regular de exercícios orientadas por profissionais de Educação Física no âmbito do SUS é mais do que urgente e é um direito dos cidadãos. 

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